segunda-feira, 29 de setembro de 2008

"Inventário das Tradições Jongueiras da Região Norte e Noroeste Fluminense"


1. Introdução
Tendo como objetivo dirimir dúvidas quanto a posições eufóricas por parte de pesquisadores que se detém a estudar os efeitos da globalização sobre a cultura popular, seguindo a linha de raciocínio do pensador italiano Antonio Gramsci, para o qual “ao lado da chamada cultura erudita, transmitida nas escolas e sancionada pelas instituições sociais, existe a cultura criada pelo povo, que articula a concepção de mundo e de vida contrários aos esquemas oficiais dominantes”, estamos estudando e inventariando as manifestações culturais de raiz, com ênfase para o jongo. Na tentativa de ativar o conhecimento sobre as manifestações culturais resultantes de fenômenos da sociedade, pesquisadores vêm promovendo e estimulando os estudos na área da folkcomunicação - rótulo destinado a propiciar reflexões sobre a interface entre a comunicação e o folclore, o que levaria/leva a uma análise aprofundada sobre o assunto, obviamente, procurando respostas sobre até que ponto, e com que interesse, algumas produções são agraciadas pela mídia. As pesquisas, no entanto, não objetivam e nem fazem o discurso da preservação das culturas. Muito pelo contrário, pois há um consenso natural de que as novas tecnologias realmente são ativadas pelo mito da destruição dessas culturas, até porque se reconhece que o grande problema “é o da perda de identidade dos grupos produtores com relação à sociedade globalizada”. A dança da Mana Chica, por exemplo, originária do Fado, é uma cultura de raiz originária da concentração de escravos africanos nos aceiros dos canaviais da zona de produção de Quissamâ, ainda existente naquele município, também no norte fluminense, ganhou impetuosidade a partir da participação de dona Mariana Francisca que, segundo pesquisas, vem ser neta de Benta Pereira, considerada a heroína campista, por causa de suas lutas contra o poderio dos Assecas. Segundo definição de Luis da Câmara Cascudo (Dicionário do folclore Brasileiro, Edição de Ouro, São Paulo), Jongo é uma dança de negros, violenta, com coreografia em roda que se movimenta em sentido lunar, isto é, em sentido contrário ao dos ponteiros do relógio, como é de costume em todas as danças de africanos. É sempre acompanhado por instrumentos de percussão - pequenos e grandes tambores chamados de tambores-de-jongo, tambu, candongueiro ou gazunga. Pode ser, também, usado o chocalho pelo cantador, solista ou acompanhado por outros cantadores, quase sempre respondendo em coro o refrão. No canto da roda exibem-se, com frenéticas umbigadas, os dançarinos, individualmente, numa coreografia específica e interessante. Depois, com o deslocamento da população do interior para a periferia, as jongadas permaneceram com seus tambores rufando, em heresia, pelas madrugadas da planície. Depois de escandalizar os aristocratas rurais, por seu jeito sensual, ocupou as franjas da cidade, confundindo-se com as batidas do Candomblé e da Umbanda. 2 - Metodologia
Os estudos foram iniciados com o levantamento bibliográfico de autores que cuidam da questão da cultura popular, para que um mapeamento fosse feito no sentido de orientar as pesquisas de campo, em todos as cidades, distritos, subdistritos, vilas e bibocas da das regiões, onde as pessoas mais antigas estão oferecendo depoimentos importantes para a consecução do registro histórico sobre os assuntos. Com o apoio do Núcleo de Iniciação à Pesquisa Científica, e do Curso de Comunicação Social, da Fafic, inclusive seus laboratórios de Rádio e Televisão, os alunos estão atuando, a partir dos indícios colhidos da bibliografia, no levantamento de novos dados sobre as áreas de estudos, para que possam ser mapeados e enriquecidos. A orientação inicial converge para a conversação com as pessoas que, depois de identificadas por sua importância, estão ser ouvidas e filmadas por câmaras, transformando em documentários. Além de ouvir as pessoas das comunidades, os alunos/pesquisadores estão visitando todas as escolas da região para saberem como as culturas desses locais são tratadas pelos professores e seus alunos, mapeando-se o que for de maior importância histórica. Estamos colhendo as letras e as músicas dos jongos existentes na periferia de Campos dos Goytacazes, Quissamâ, São Francisco de Itabapoana, Cardoso Moreira, Italva, São João da Barra e Miracema e Santo Antonio de Pádua. Em Campos a pesquisa está sendo feita nos bairros mais afastados, como Parque da Aldeia, Cidade Luz, Custodópolis, Morro de Fátima, Eldorado, Bandeirantes. E distritos como: Travessão, Ururaí, Barcelos, Goytacazes e Santa Cruz. Em outras cidades, o grupo já esteve em São Francisco de Itabapoana, Cambuci e São Fidelis.
3. Resultados e Discussões
Em Campos e na região Norte e Noroeste Fluminense, o jongo sempre foi, tradicionalmente, cantado e dançado por negros oriundos da escravidão, não se estabelecendo o tempo de seu início, mas pode-se imaginar que os primeiros jongueiros vieram para o Brasil, oriundos de Angola, e aqui desenvolveram esta cultura e a mantiveram mesmo depois da abolição da escravatura. O nosso grupo conseguiu, até agora, catalogar mais de 100 pontos de jongo, através de entrevistas com velhos aficionados dessas manifestações e a perspectiva é a de que possamos, a médio e longo prazos, recolher, pelo menos, 200 a 300 composições que muito podem contribuir, a partir da sociolingüística, com o pensamento e a inspiração dos negros escravos ou livres nos últimos 120 anos. Nas reuniões de avaliação os alunos bolsistas salientam, sempre a importância da pesquisa científica e os resultados que podem oferecer, pelo ponto de vista antropológico. Uma dificuldade encontrada pelos alunos bolsistas, principalmente no interior é o esvaziamento das antigas zonas de produção. Constatou-se que os cultores das chamadas raizes culturais estão hoje, em decorrência do êxodo rural, espalhados pelos núcleos favelados das franjas da cidade.
3. Conclusões
O trabalho não pode ser considerado pronto, até porque, das pesquisas agendadas o grupo não conseguiu, ainda, cobrir todas as instâncias e o mapeamento decorre do encontro com os antigos jongueiros, herdeiros das tradições. Mas, podemos assinalar:-* Descoberta dos Quilombos de Barrinha e Deserto Feliz -* Encontro com antigos jongueiros de Goytacazes, nas dependências do Solar do Colégio, na Baixada Campista. * Recolhimento de letras e músicas de jongos remontando os tempos da escravidão. E mostras de jongadas, em Barrinha. (S.Francisco). * Contato com o IPHAN para o reconhecimento das nossas pesquisas e inventários dos grupos mapeados.* Encontro de Jongueiros da Região Sudeste, em Piquete, São Paulo.
Sugerimos o prosseguimento das pesquisas, ampliando levantamento no Leste de Minas Gerais e ao sul do Espírito Santo, onde há jongos com o nome de Caxambu (MG) e Congadas(ES), respectivamente.- Além das manifestações jongueiras, a equipe vem encontrando outras culturas, como desafios, versejadores, extravagâncias, Barabadás e o Lanceiro, além da dança da Mana Chica.- Conseguimos recuperar o famoso tambor, de nome “Corre Mundo”, uma peça com mais de 150 anos e que se encontra na FAFIC.
4. Referências Bibliográficas
BELTRÃO, Luiz, Folkcomunicação A Comunicação dos Marginalizados, Cortez Editora, São Paulo, 1980.
BENJAMIM, Roberto, Folkcomunicação No Contexto de Massa, Edições CCHLA, João Pessoa/Natal-2001.
BOSI, Alfredo, Cultura e Tradição, Zahar, Rio de Janeiro, 1986.
LAMEGO, Alberto, O Homem e o Brejo, IBGE, Rio de Janeiro, 1945.
RODRIGUES, Hervé Salgado, Campos Na Taba dos Goytacazes, Imprensa Oficial, Niterói, 1988.
SOARES, Orávio de Campos, Muata Calombo Consciência e Destruição, Editora Fafic, Campos dos Goytacazes, 2004.

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